Havana-Cuba, 18/02/08, escrevia-se lá uma carta que seria, certamente, a notícia mais comentada durante o dia seguinte pelo mundo. Poderia ser, então, mais uma terça-feira pacata, sem muita novidade, com a mesma rotina de 49 anos atrás, como se o tempo não tivesse passado, cujas rugas nos rostos da “velha-guarda cubana” comprovam a realidade dos anos vividos, se não fosse uma publicação especial no Granma, o principal jornal da ilha.
Era uma carta do presidente Fidel Castro Ruz, 81 anos. Nela, ele dizia, “- Não aspirarei nem aceitarei o cargo de Presidente do Conselho de Chefe e Comandante-em-Chefe”. Era exatamente o afastamento oficial da cena política de um dos maiores mitos do socialismo mundial. Amado, temido, idolatrado, julgado, herói e imortal, “El Comandante” – em virtude da frágil saúde, pública desde 2006 – passa o “trono” da ilha ao irmão Raúl Castro Ruz.
Aos 76 anos, o novo presidente é comandante das F.A.R(Forças Armadas Revolucionárias) desde o início da revolução. Participou de forma profunda em todos os processos revolucionários. Porém, o intrigante é: o que fará Raúl agora que é o comandante máximo do Governo Revolucionário? Sem dúvida, é uma difícil previsão, mas há motivos suficientes que indicam mudanças futuras em Cuba.
O caçula dos irmãos Castro é visto como o mais democrático e aberto ao diálogo quando se trata de mudanças econômicas no governo, levando esperança de real prosperidade na ilha caribenha. É a novidade que o povo cubano anseia, de que Raúl, mesmo sendo da velha-guarda, leve o país ao desenvolvimento econômico, sendo mais liberal e possibilitando uma abertura para o cenário global.
Segundo a professora de Jornalismo Político e América Latina da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Maria Aparecida Pascal, o que Raúl provavelmente quer é abrir a economia cubana, mas preservando as conquistas sociais da revolução, como o baixo índice de analfabetos e a avançada medicina lá desenvolvida. Para ela, é quase certo que Cuba fará uma transição “aos moldes chinês”, ou seja, uma economia de mercado com o sistema político fechado. Ela reitera, ainda, que possíveis avanços só poderão ocorrer com o fim do bloqueio econômico americano, imposto desde a crise dos mísseis, em 1962. Tal medida político-repressora causou o empobrecimento e a sucateamento daquele país após o fim do auxílio econômico – no início dos anos 90 – dado pela então União Soviética.
Mas Raúl sempre foi marxista de carteirinha, e é difícil acreditar que ele vá mudar sua ideologia. Isto ficou claro em discurso recente: “Só o socialismo é capaz de vencer as dificuldades e preservar conquistas de quase meio século de revolução”. Tal fato pôde ser observado pelo intelectual brasileiro, Frei Betto, que voltara de um recente encontro com Raúl, declarando: “Não há sintomas, em Cuba, de setores significativos interessados na volta do capitalismo. Raúl, desde o ano passado, mobilizou a sociedade para fazer criticas à revolução”. E finalizou defendendo o sistema cubano: ”- Haverá reformas para aprimorar, e não renegar, o socialismo”. Afirmou o histórico esquerdista brasileiro.
De fato, o que Cuba precisa agora, nesta oportunidade histórica, é a modernização geral da ilha. Atualizar a política, as ideologias, a agricultura, os sistemas comerciais, sociais e urbanos, além de sintonizá-los com a riqueza ímpar construída pelos cubanos neste meio século de Revolução.
PS:Este texto foi publicado, de forma adaptada, na edição de abril de 2008, no jornal "DizFoca".