terça-feira, 5 de agosto de 2008

Personal Che - Documentário contextualiza o mito do Comandante



O documentário Personal Che não tem a pretensão de negar a humanidade do revolucionário Ernesto Che Guevara e muito menos enaltecê-lo como “salvador” do mundo. Com uma proposta simples, o diretor sai mundo a fora registrando o que representa a figura de Che em diferentes países com contextos econômicos,sociais e políticos distintos.

Na Bolívia, onde foi morto – provavelmente pela CIA -, Guevara é, literalmente, cultuado como um Santo; pessoas rezam para ele, assim como para o próprio Jesus Cristo. O local onde o corpo foi encontrado, deitado e ainda com os olhos abertos, exposto para o mundo, registrado em vídeo e fotos, hoje é um verdadeiro santuário. Pessoas visitam o lugar como se visitassem a tumba do mártir cristão.


O documentário deixa claro que a imagem de guerrilheiro, comunista ateu e soldado que manejava armas de fogo, é algo bem distante do conhecimento do povo boliviano que o cultua. Talvez, um dos registros mais belos do vídeo, é o choque de uma devota de Che ao ouvir que ele era ateu; de que o comandante descria no cristianismo,Jesus ou Deus. Os olhos da senhora simples denunciam a profunda desilusão com o paradoxo de sua fé.


A passagem por Cuba, como não diferente do que imaginamos, retrata o grande herói da revolução. O sonhador que deixou o país de origem (Che era Argentino de nascença, mas “latino-americano de coração e alma”, como ele mesmo dizia) para lutar pela liberdade e pela justiça do povo cubano. Um ídolo, que não pode e não deve ser esquecido. Cultuado e admirado no país inteiro. Um exemplo a ser seguido, ou a ter como filho. É o caso de Ernestito, mostrado no filme, uma criança educada pelo pai a ser tão íntegro quanto Guevara.


É na ilha cubana que ocorre outro ponto marcante do filme, mais um em que uma simples informação, ou foto no caso, vai de encontro à imagem do mito. O pai de Ernestito, como toda a família, fica abalado ao ser apresentado a foto clássica do Che morto. Segundo ele, nunca vira ou mesmo ouvira falar daquele registro. As feições destes cubanos são como um verdadeiro soco no estômago. Mesmo depois de 40 anos morto, a foto macabra de Guevara nunca foi apresentada ao seu povo; ao povo cubano, que arduamente digeriu a notícia dada por Fidel Castro, quatro décadas atrás, que um dos principais responsáveis da Revolução havia sido morto pelo imperialismo estadunidense.

Na Alemanha, o socialista/comunista Che Guevara é igualado ao nazista/fascista Adolf Hitler, que comandou a execução de, pelo menos, 6 milhões de pessoas, vítimas da xenofobia do líder alemão e por um projeto de construção de um país de raça pura;ariana. Nada de tolerância ou união de povos e raças, neste contexto alemão, Che é colocado como um revolucionário e que morreu por um ideal, tal como Hitler.

Já nos Estados Unidos, o choque de latino-americanos esquerdistas com cubanos anticastristas finaliza o filme, contextualizando a grande discussão em torno do mito e da imagem - uma das mais reproduzidas do mundo - que Ernesto Che Guevara representa no contexto atual. De um lado, amado, idolatrado e modelo de exemplo, que incentiva pessoas e corações em busca de um mundo melhor; o da conquista da utópica justiça social. Do outro lado, um assassino e bandido que ajudou Fidel Castro a implantar uma das mais duradouras ditaduras do planeta.


Independente da orientação ideológica do espectador, o filme parece conseguir feito raro quando se trata do fenômeno Che: imparcialidade. Da mesma forma que o adorador de Che Guevara se sentirá incomodado ao ver retratado o comandante violento, o que detesta não gostará de ver o lado humano e romântico que teve o médico argentino.

Certamente o documentário Personal Che cumpre o seu papel, o de tentar documentar um fato: o fenômeno criado entorno de um homem.



Sobre o Filme:

Personal Che, EUA/Colômbia/Brasil 2007 - 90 min. – Livre.
Gênero: Documentário
Direção: Douglas Duarte e Adriana Mariño.
Distribuição: Filme do Estação
http://www.personalche.com/
http://personalche.blogspot.com/

Em exibição no Cine Bombril, São Paulo. Mais informações: www.cinebombril.com.br